História

Uma história
no singular

A abertura da Rua Alexandre Herculano fez parte da expansão que Lisboa conheceu na década de 1860, nomeadamente dos arruamentos projetados por Ressano Garcia, em sequência do plano de melhoramentos do Ministério das Obras Pública de 1864. Estes planos de urbanização terminam com o passeio Rainha D. Amélia, transformando o jardim murado, que incluía a área da Avenida da Liberdade e Marquês de Pombal, na nova urbanização da Lisboa das Avenidas.

Em alternativa à já existente Rua do Salitre, nascem duas importantes artérias paralelas entre si e perpendiculares à Av. da Liberdade; a Rua Alexandre Herculano e a Rua Braamcamp. Lisboa é então uma cidade em grande desenvolvimento, com uma dimensão muito própria, onde nascem edifícios à mesma altura que os anteriores pombalinos, mas com a novidade da fachada individualizada e personalizada.

Estes mesmos quarteirões foram alvo de recentes restauros e exibem agora o seu brio intrínseco, de múltiplas fachadas e diferentes correntes culturais e estéticas, internacionais ou não, apoiadas em desenvolvimentos técnicos à escala da Lisboa de então.

O projeto do edifício da Rua Alexandre Herculano 19 data de 1893 e tem como provável autor um arquiteto francês, não identificado nos registos da Câmara Municipal. Marcam-no a característica mansarda da Paris de Aussmann, tão em voga na altura, bem como a estética e o material que a revestem. A aparente assimetria de algumas janelas da fachada de recorte desigual, bem como as diferentes varandas entre si, estão esteticamente inscritas numa linha de rigor equilibrado. Sublinhe-se ainda o desafio ganho com a inclusão de apontamentos de nova estética, inseridos numa ordem clássica bem ordenada.

O projeto  para o 19 da Rua Alexandre Herculano, ocupa o espaço vazio entre os nºs 17 e 21, à data já construídos. 

Típico edifício de “rendimento”, tem a construção mais longa e recuada do quarteirão e à semelhança de uma casa autónoma, cada andar possui acessos independentes para a entrada principal, de serviço e ainda um “quarto independente”, onde maioritariamente funciona a atividade profissional do inquilino.

Como recurso frequenta à época, os quartos são virados para o interior com iluminação natural de 2 saguões e as salas para o exterior, na fachada principal e traseira.

É um edifício é composto por 6 pisos e uma loja na cave, originalmente destinada a mercearia e venda de vinhos e bebidas finas, com uma bonita decoração original a óleo no teto, predominando beija flores em cores harmoniosas e tom pastel. 

O interior do edifício à data da construção não prevê o elevador, no entanto este será instalado cerca de 30 anos mais tarde, facilitando a sua circulação interior, que hoje renovado assegura o acesso aos diferentes patamares.

Nas 3 décadas de pós construção, o edifício albergou alguns ocupantes à época conhecidos na sociedade lisboeta e nacional.

Ali residiram por vários anos o Senhor Cónego Damasceno Fiadeiro, aluno de Egas Moniz e Damas Mora, capelão da casa real, confessor da Rainha D. Amélia perceptor dos Príncipes D. Luis Filipe e D. Manuel, camareiro secreto de S. Santidade, entre muitas outras responsabilidades.

A Dr.ª Maria Luísa de Saldanha da Gama Van Zeller, assistente na Universidade de Medicina de Paris e afamada diretora da Maternidade Alfredo da Costa.

José de Moraes, homem de cultura literária, fundador da famosa Editora Moraes, extinta em 1999, cujos direitos aos títulos foram comprados e reeditados pela Editora Centauro e António Alçada Batista e Eduardo Laemmert Bulcão, fidalgo açoriano, filantropo, figura marcante nos meios açorianos. Proprietário original do edifício que, à semelhança de outros investidores, cedo aposta nesta recente parte de Lisboa, aonde virá mais tarde a viver os últimos anos de vida, ocupando com a sua família os 4º e 5º andares. O edifício ainda se encontra na posse da sua família.

Eduardo e Maria Bulcão

No primeiro contacto com o interior, imediatamente reparamos no magnifico teto do hall de entrada, ricamente decorado com figuras humanas masculinas e femininas, suportando um largo medalhão floral.

Logo depois, impressionam as paredes ricamente apaineladas e as portas de guarda vento, em detalhe assimétrico art nouveaux.

O interior é profusamente decorado com rodapés de escala nobre requintadamente apainelados, portas duplas apaineladas, sancas de palmetas, tetos de estuques decorados, alguns rocailles ainda com decoração original a óleo, outros de estrutura mais geométrica, decorada a frutos com pintura trompe l´oeil imitando madeiras nobres, tão ao gosto da época. Nas zonas nobres e comuns as paredes são apaineladas.